Sábado chuvoso em São Paulo. Passei parte da manhã matutando sobre o que fazer com ele. Adiantei o que pude, com a ajuda de minha mãe e no meio do dia decidi levá-lo ao teatro para assistir João e Maria, da Cia. Le Plat du Jour. Não gosto muito da estória, pois me aflige a idéia de um pai abandonar os filhos na floresta. De qualquer forma, dois fatores me levaram a decidir por ela: o teatro era muito perto de casa, alguns quarteirões apenas; e ele tem o livro e gosta muito. Ponto negativo: o ingresso era meio caro. Pesei e superei a questão grana!
Chegada a hora, fomos eu, ele e minha mãe. Ele estava eufórico, achando que iria encontrar os personagens dos Saltimbancos (a sua primeira e última peça teatral). Expliquei pela milésima vez que a peça era do João e Maria e que o Jumento não estaria lá.
Entramos no teatro e fomos para as nossas cadeiras, escolhidas a dedo, no gargarejo. O cenário já estava montado e consistia num painel forrado com tiras de pano, simulando uma floresta meio soturna, como a da estória. Guga fica olhando, olhando, olhando e tchan! Vira para mim com cara de terror e fala apavorado, ao mesmo tempo que corre: - Mamãe, quero ir pra casa!!!!!!!!!!! Sai num pique danando em direção à saída do teatro. Tenho dificuldade para alcança-lo e o encontro apavorado e irredutível. Não tinha santo que fizesse com que ele voltasse à sala do teatro. Ele nem queria conversar. E eu, apavorada com a idéia de ter que desistir do programa, já tendo gastado uma boa grana com os convites.
Conversa vai, conversa vem, nada dele se convencer. Pensei em várias coisas ao mesmo tempo: (i) Será que o meu desgosto pelo teatro foi transmitido geneticamente para ele? (ii) Criança é uma caixinha de surpresas! (iii) Não posso morrer com esse prejuízo, preciso pensar rápido numa solução! Aí me veio uma luz: - Guga, você quer um chocolatinho? Você come sentado nesse banquinho, enquanto a gente conversa sobre a peça, filho... Ele aceitou na hora o M&M´s (o pior dos piores). Sei que apelei ao inimigo, mas valeu. Já embevecido pelo chocolate foi possível travar um diálogo e ele aceitou, depois de comer 1/3 do saquinho, a ficar na última cadeira do teatro, aquelas extras que colocam para os retardatários. Firmou até o compromisso de esperar a peça começar e depois, se gostasse, seguiria para a nossa cadeira lá na frente. Se não gostasse, eu prometi que iríamos para casa. Tudo isso com ajuda das recepcionistas que ficavam elogiando a peça, induzidas pelos meus olhares desesperados. Nesse meio tempo, imaginei a minha mãe lá, sozinha e deus, sem ter a menor noção dos meus avanços, pensando talvez que eu já tinha ido embora.
Agora, olha a descaração da figura! A peça começa com dois passarinhos dialogando, com um sotaque nordestino de pernambucano, que Gustavo ama. Aquele medo se transformou na imediata admiração. Quando eles, os passarinhos, começaram a cantar um baião, o menino danou a dançar, como se nunca tivesse querido se pirulitar de lá. Eu, espertinha que sou, propus voltar às nossas cadeiras e ele aceitou na hora, esquecendo para todo o sempre os M&Ms.
A peça correu bem e até me surpreendeu positivamente. Bem, Gustavo seguiu hipnotizado, fascinado até o final e até chorou para ir embora. Agora, eu é que embarcasse no primeiro drama, tinha ido pra casa, sem eira nem beira.
No outro dia, o pai encontrou o M&M´s na bolsa e estranhou. Perguntou para ele, que imediatamente passou toda a ficha para o pai, contando nos mínimos detalhes a nossa odisséia.
Moral da nossa história da vida real:
1) Criança é uma caixinha de surpresas!
2) Paciência, dialogo e imaginação são aliados importantes! Mas um chocolatezinho, às vezes, é de uma eficácia insuperável.
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