Está rolando uma blogagem coletiva sobre esse tema. É um dos que mais me mobiliza nessa vida. Mas, antes de falar de racismo, acho melhor falar um pouco sobre a minha visão sobre preconceito, em geral.
Acho que preconceito é uma postura inerente ao ser humano. É uma forma de tentar se antecipar a uma determinada situação, para não se surpreender. Antecipamos um julgamento, um conceito e com isso achamos que damos conta de controlar a vida. É difícil não ter preconceitos, é quase impossível. Mas quando os preconceitos nos prejudicam ou prejudicam os outros, devemos buscar evitar, refletir, mudar o rumo das coisas.
Então, o racismo, a homofobia, o sexismo, são formas de julgar as pessoas antecipadamente, com base em falsos conceitos, de que os negros (ou qualquer outra raça), os homossexuais, as mulheres, são categorias de pessoas que se distinguem das outras negativamente.
Sobre o racismo contra negros e preconceito contra nordestinos posso dar o meu testemunho, pois já sofri na pele, de forma direta ou sutil. A forma sutil é, para mim, a pior delas, é que a te deixa sem defesa, já que você chega a pensar que é paranóia, que é mania de perseguição. E aí o constrangimento fica por isso mesmo. Por exemplo:
Uma vez, estava com Guga no sling, num café tradicional daqui dos Jardins. Tava num papo com uma mãe, loura, com sua filha também loura. Chegou uma mulher, elogiou Gustavo e depois, sem nem me olhar na cara, se voltou para a mãe loura e perguntou se Gustavo era filho dela. Na hora, eu respondi, de forma ríspida, que era MEU FILHO. Mas ficou no ar o constrangimento, a ponto dela se desculpar.
Outra vez, estava com Gustavo no Museu da Casa Brasileira, brincando com ele e com conversando uma umas meninas, na faixa dos seus 8, 9 anos. Conversa vai, conversa vem, elas perguntaram na lata se eu era a babá de Gustavo. Falei que não, que era a mãe. E elas se surpreenderam, dizendo que não parecia.
Nas duas situações, ficou claro para mim que, na cabeça daquelas pessoas, a mim só restava ser a babá do meu filho. Não é novidade que, no imaginário da sociedade, aos negros cabem os papéis sociais que remontam à condição servil. A possibilidade de ser a mãe de uma criança com a pele clara estava descartada, não foi cogitada.
O pior foi quando eu fui contar isso aos amigos que, em sua a maioria. brancos, sem sentir, destilaram o preconceito quando tentaram justificar a situação. Ouvi as seguintes frases: - Você estava desarrumada?; - Mas, Evie, você deveria se vestir melhor, depois que virou mãe, você anda muito largada.
Ora, meus poucos leitores, quer dizer que para ser identificada como mãe do meu filho, eu terei que vestir roupa de gala. Se eu fosse branca, poderia estar de sandálias havianas, que nada aconteceria. O negro tem que ser o mais inteligente, o mais arrumado, o mais competente, senão, nunca será o dono do carro importado, mas, sim, o motorista, nunca será a cliente da loja, a mãe do filho branco, mas, sim, a sua babá que, por liberalidade da patroa, não está fardada de branco.
É como diz a música Ilê de Luz (composição de Suka-Carlos Lima), "até, meu bem, provar que não, negro sempre é vilão."
Outro ponto que não posso deixar de analisar é o fato de que, aquelas meninas que conversavam comigo no Museu, apesar de estudarem numa escola Waldorf, tida como inclusiva e tal, certamente não tinham vivenciado uma situação em que uma mulher negra e nordestina não as tivesse servindo. E os pais, tão graduados quanto eu, provavelmente não se preocupam em educá-las de outra forma.
Isso é triste e lamentável. E a mim, o que me cabe fazer para educar Gustavo nesse contexto?
1) Passar para ele a idéia de que ele é mestiço, assim como eu e o pai dele.
2) Ensinar que a nossa cor e outros traços físicos são fruto da coragem de gente que rompeu barreiras e se misturou e se enriqueceu culturalmente com isso.
3) Ensiná-lo a se impor e a descortinar o preconceito velado.
4) Combater com clareza suas eventuais atitudes preconceituosas, que certamente e infelizmente ocorrerão.
Em termos genéricos é isso ai. Só que, somente no detalhe, na vida cotidiana e nas pequenas atitudes é que se educa contra o racismo, principalmente, aquele que se encontra nas entrelinhas, de difícil comprovação e, consequentemente, de difícil punição.